A linha que separa o consumo recreativo de álcool da dependência de álcool é muito ténue e pode ser ultrapassada com facilidade.

O álcool é uma substância psicoativa amplamente utilizada em muitas culturas durante séculos.

O alcoolismo é o termo utilizado para designar a Síndrome de Dependência Alcoólica ou Perturbação do Uso de Álcool. É uma doença crónica em que o uso excessivo e contínuo de álcool interfere negativamente em todas as áreas da vida, tanto familiar, como pessoal, social e/ou profissional, com degradação gradual de todos os planos de vida.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica o alcoolismo como uma doença psiquiátrica, que apresenta aspetos físicos e mentais. Assim sendo, apesar de existirem fatores fisiológicos envolvidos, muitas vezes a dependência é psicológica.

O consumo de álcool é um problema em todo o Mundo. Em Portugal, o álcool é a substância mais consumida e a dependência de álcool aumentou quase 50% na última década. Apesar de afetar mais os homens do que as mulheres, o consumo de bebidas alcoólicas entre mulheres portuguesas está a aumentar. Além das mulheres, também tem aumentado entre os jovens e na faixa etária acima dos 45 anos.

Sinais e Sintomas de dependência alcoólica

O consumo abusivo de álcool pode levar a:

  • Desejo incontrolável por bebidas alcoólicas;

  • Falta de controlo no consumo (para começar, parar ou regular a ingestão de álcool) com incapacidade de diminuir o consumo de álcool;

  • Desenvolvimento de tolerância: habitua-se progressivamente aos efeitos do álcool e sente necessidade de maiores quantidades de álcool para obter o mesmo efeito;

  • Sinais de abstinência física ao cessar o consumo (ansiedade, tremores, insónia, suores, náuseas, vómitos, agitação psicomotora, irritabilidade, etc) e necessidade de consumir para atenuar estes sinais;

  • Diminuição da inibição e quando embriagado, pode ter comportamentos de risco, como a condução sob o efeito do álcool, comportamentos sexuais de risco ou aumento da agressividade quando confrontados;

  • Continuar o consumo apesar das consequências físicas, psicológicas, familiares e sociais.

Consequências do consumo excessivo de álcool

Consequências a curto prazo

O álcool é depressor do sistema nervoso, isto é, diminui a atividade do cérebro e pode:

  • Afetar os pensamentos, emoções, capacidade de julgar e decidir;
  • Alterar o comportamento: euforia, desinibição, impulsividade, agressividade;
  • Afetar a memória, diminuir a concentração e falta de atenção;

  • Alterar o equilíbrio, com dificuldade de coordenação muscular;
  • Interferir na fala com voz arrastada e dificuldade em formular frases;
  • Aumentar o risco de acidentes domésticos e de viação
Consequências a longo prazo

A longo prazo, o consumo abusivo de álcool pode afetar gravemente a saúde física, com risco de:

  • Problemas cardíacos: hipertensão arterial, enfarte do miocárdio, acidente vascular cerebral;
  • Problemas digestivos: cancro oral, gastrite, úlcera e inflamação do pâncreas;
  • Doenças do fígado: hepatite, cirrose, cancro;
  • Disfunção sexual;
  • Problemas nos músculos e ossos;
  • Infeções graves.

Além disso, o consumo problemático de álcool pode provocar ou agravar algumas doenças mentais:

  • Depressão,
  • Ansiedade e ataques de pânico;
  • Doença bipolar;
  • Demência;
  • Psicose;
  • Perturbações do comportamento alimentar;
  • Perturbação obsessivo-compulsiva.

Tratamento

É importante reconhecer, aceitar e/ou perceber o problema para aprender a lidar com ele.

O tratamento exige uma abordagem personalizada e multidisciplinar.

O principal objetivo é conseguir a privação (abstinência) do consumo de álcool estável e definitiva.

Este processo envolve:

  • Planos de desintoxicação;
  • Medicamentos orais e injetáveis;
  • Aconselhamento psicológico;
  • Intervenção familiar e/ou grupos de apoio;
  • Reabilitação.

Pode ser necessário o acompanhamento em consulta por um período limitado ou prolongado de tempo, bem como, o internamento curto ou mais prolongado de acordo com a situação (por exemplo, o internamento numa comunidade terapêutica).

O tratamento farmacológico é direcionado para o controlo dos sintomas e a redução do desejo de beber. Não há nenhum medicamento para curar o alcoolismo. Cada caso é um caso único e escolhe-se a melhor opção para cada pessoa.

A psicoterapia é aliada dos medicamentos e a combinação é a forma mais eficaz de atingir melhores resultados.

O suporte da família, amigos e grupos de apoio, também é fundamental para a recuperação.

Nos casos em que há dificuldade de tratamento em ambulatório (no domicilio), porque há vários fatores de risco para o consumo de álcool, o internamento de curta duração pode ser uma opção.

No internamento, há vigilância 24 horas por dia para controlo dos sintomas e avaliação médica frequente. Os utentes são medicados de acordo com a necessidade para evitar os sintomas de abstinência, que em algumas situações podem ser graves. O internamento garante ainda o apoio psicológico, nutricional e, em alguns casos, até mesmo, terapia ocupacional e fisioterapia, o que aumenta a probabilidade de sucesso e o retorno à vida da melhor forma possível.

Evitar as recaídas é fundamental. Por isso, o acompanhamento a longo prazo é crucial para assegurar o processo de abstinência, mesmo em momentos de maior fragilidade.

Ter consciência que o problema não é dos outros e que cada dia sem álcool é uma conquista!

Dra. Liliana Ferreira

Dra. Liliana Ferreira

A Dra. Liliana Ferreira é médica psiquiatra no Unisana Hospitais – Hospital do Oeste Soerad. Com uma formação diversificada e experiência em psiquiatria geral e comunitária, dedica-se ao tratamento de perturbações do espectro afetivo e dependências. Além disso, tem experiência em intervenções na área da psicose e cuidados de saúde mental comunitários. Para mais informações sobre o seu percurso, consulte a sua página aqui.

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